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A Inês tem  31 anos, é casada com o Luís e são ambos veterinários. Têm dois filhos: o Duarte de 4 anos e  o Manel de 9 meses.  A Inês fala de como as experiências de ser mãe pela primeira e pela segunda vez são tão diferentes. E explica que, mesmo enquanto a mãe processa um parto que não aconteceu como se sonhava, o amor pode brotar livremente quando temos o nosso bebé ao colo.

Como foram as tuas gravidezes?

A primeira gravidez não foi planeada mas foi muito desejada e feliz. Tive zero sobressaltos e, tirando os enjôos do primeiro trimestre, foi tudo pacífico do ponto de vista físico. Por incerteza do futuro em termos de emprego e ausência de respostas por parte do hospital para o qual trabalhava, o stress e a ansiedade dominaram toda a gravidez. Acho que não imaginava nada. Hoje sei que estava muito pouco informada sobre tudo e no fundo esperava-me o desconhecido. Sempre soube que iria amar aquele bebe incondicionalmente mas o “eu” mãe ainda não tinha nascido e por isso não me imaginava de forma nenhuma.

Na segunda gravidez: já sabia que o amor incondicional é o que pauta a minha maternidade. Já sabia que acredito que o colo, o calor, o amor, a maminha da mãe, o aconchego são quase tudo o que um bebé precisa. Por isso já sabia que iria ser essa mãe.

Que medos tinhas?

Na primeira gravidez o receio de não ser capaz de lhe suprir necessidades, de não o conseguir amamentar e de não perceber o que ele precisa em determinado momento. Na segunda, o receio de não ser capaz de ser mãe de dois, receio da reacção do Dê à perda de exclusividade, receio de “trair” o Dê ao amar um segundo bebe, receio de magoar o Dê.

Como foi o nascimento? O que sentiste quando viste os teus bebés pela primeira vez?

Quando vi o Duarte pela primeira vez estava atordoada. Contra tudo o que quis toda a gravidez, ela terminou numa indução que ao fim de 12h terminou numa cesariana com epidural e Propofol. Senti medo. Muito medo. Aquele ser minúsculo dependia da minha capacidade de ser mãe dele.
Na segunda gravidez: uma vez mais quis com todas as forças um parto normal, mas as semanas passaram e nada acontecia. As 41 semanas nova cesariana marcada sem qualquer emoção ou romantismo. A preocupação com a reacção do Dê à minha estadia no hospital e à presença do irmão, a dor física e emocional da segunda cesariana e o sentimento de incapacidade de parir os meus filhos dominaram-me durante todo o tempo da cesariana.

Quando o vi (mais de uma hora depois dele nascer) senti uma necessidade visceral de cuidar dele. De o cheirar, abraçar e amamentar. O meu filho não pôde contar comigo para o parir. Mas a partir daquele momento podia contar comigo para tudo.

E a chegada a casa?

No Duarte, a chegada a casa coincidiu com a subida de leite. Nada de muito violento do ponto de vista físico e eu sabia bem o que fazer mas… pela primeira vez as pernas incharam horrores, estavam 45°C, o Dê chorava em loop e as minhas hormonas estavam completamente doidas.
O que resume a chegada a casa foi o telefonema para a linha saúde 24 a pedir ajuda porque ele não estava bem e só chorava/berrava.
A pergunta do outro lado do telefone foi “Calma mãe. Preciso por favor que me diga… O seu bebe está a respirar?” Nesse momento percebi que estava descompensada.
No Manel, entrámos os 4 em casa. Os 4 felizes! quando nos apercebemos que não temos a mala da maternidade. Ficou no parque de estacionamento do hospital!
De resto foi um dia maravilhoso. O leite já tinha subido, o Manel super tranquilo a mamar e dormir e o Dê feliz de sermos finalmente 4 em casa. À parte o desconforto físico foi perfeito.

Em que é que sentiste que foste apanhada desprevenida?

Na primeira gravidez,  o pós parto apanhou-me completamente desprevenida.
Ninguém me tinha dito que os bebês choram, alguns choram muito, alguns choram sempre e alguns choram a um volume inimaginável e nada os cala. Li de tudo sobre o choro dos bebês. Descobri que há bebês hipersensíveis e irritáveis. Descobri que a mamar ele estava tranquilo. Foram incontáveis os dias que passei sentada no sofá a dar de mamar e a amar o meu filho. Nesses momentos de paz tudo era perfeito.
Depois do Dê estava preparada para o pior… Nada me podia apanhar de surpresa. E veio o Manel! O bebe mais tranquilo possível. Mamava e dormia. Não me lembro de o ouvir chorar.

Qual foi o pior momento?

No primeiro filho, a chegada a casa; todos os muitos momentos em que, após horas infinitas de choro consecutivo, consegui perceber o grau de insanidade que leva ao “shaken baby syndrome”; todas as vezes em que me senti a pisar a linha de lucidez e tive de o pôr na espreguiçadeira e virar costas para respirar 5 minutos; todas as vezes que senti que o meu filho estava avariado e que eu não sabia ser mãe dele; todas as vezes que me enchi de coragem para sair de casa e assim que chegávamos a algum lado ele começava a chorar e eu me sentia a pessoa mais minúscula possível; toda a solidão em que vivi os primeiros meses.

No segundo bebé, o momento em que, com 11 dias de vida, internado na Estefânia, vi o meu filho em agonia sem respirar; o momento em que horas depois o vi numa incubadora, sem lhe poder tocar e cheia de medo de o perder…

O que sentiste que te ajudou?

No Duarte, a única coisa que realmente me ajudou foi aceitar. Aceitar o meu filho como ele era e deixar de o querer mudar. Aceitar que se ele queria chorar ia chorar ao meu colo. Que se queria dormir ao meu colo enquanto o embalava então seria isso que lhe iria dar. Ele continuou a chorar e a não dormir e eu a não dormir com ele. Mas tudo ficou muito melhor apenas por ter aceitado!

Com o Manel,  ajudou muito tudo o que vivi com o Dê, ajudou toda a preparação que fiz para o que aí viesse, ajudou a existência de uma “Fada” especial na minha vida, e ajudou o Manel ser desde sempre um bebe fácil de satisfazer; uma rede de amigas com bebés da mesma idade do Manel: poder conversar, trocar ideias, sentimentos e momentos pautados pela sinceridade, pela verdade e pela diversidade não tem preço e é fundamental.

E o que não ajudou nada?

Os palpites de toda a gente, o facto de toda a gente achar que tinha uma solução infalível (o que me fazia sentir ainda pior), o facto de ninguém se ter disponibilizado genuinamente para ajudar, o olhar reprovador dos outros (admito que haja aqui uma componente de insegurança minha que me fazia ter esta leitura…); a constatação (tardia) de que muitas mães mentem: os filhos nunca choram, dormem noites inteiras desde que nascem, não fazem birras…alguns desses bebés talvez nem fizessem cocó (ou se o fizessem cheiraria a rosas certamente).

O momento mais belo?

Na segunda manhã de vida do Duarte, depois de uma noite horrível no hospital, em que ele chorou consecutivamente durante 8h00,  acabei por deitá-lo ao meu lado e adormeceu a mamar e assim ficou. A luz da manhã iluminou-o enquanto dormia tranquilo e nesse momento vi o bebé mais lindo do mundo e percebi que para sempre o meu coração iria bater fora do meu peito.
Com o Manel, foi poucas horas depois de nascer, enquanto lhe dava de mamar tranquilamente, e o Dê veio ver-nos. Saltou para o meu colo e aninhou-se em mim e no Manel a fazer-nos festinhas. Uma ternura sem fim. Nesse momento o meu coração passou a bater em dois compassos fora do meu peito.

O que mudou em vocês enquanto casal?

Mudou numa fase inicial a disponibilidade um para o outro; mudou o imediatismo com que de um momento para o outro se decidia ir passar um fim‑de‑semana fora; nasceu e cresceu a admiração pelo pai que eu não conhecia (sentimento que sei ser mútuo). Tive pouca ajuda do Luís deu no primeiro ano de vida do Dê e foram meses extenuantes para mim, e nessa altura não foi fácil.

Se desses um conselho a ti mesma, no dia antes de ter nascido o teu primeiro bebé, qual seria?

Aceita o teu bebe, ouve-o e respeita-o. Há fases difíceis mas passam e até essas deixam saudades.

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